E. Bechara: “Com o domínio do português as novas gerações galegas teriam mais uma porta aberta para conseguir um bom emprego”

O currículo do professor Evanildo Bechara é sobradamente conhecido: professor titular e emérito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da Universidade Federal Fluminense (UFF), titular da cadeira nº16 da Academia Brasileira de Filologia e da cadeira nº3 da Academia Brasileira das Letras, doutor Honoris Causa pela Universidade de Coimbra e membro correspondente da Academia das Ciências de Lisboa. É autor de várias das principais gramáticas da língua portuguesa: Moderna Gramática Portuguesa; Gramática Escolar da Língua Portuguesa; Lições de Português pela Análise Sintática. Uma das referências no âmbito da linguística no Brasil.

A seguinte entrevista foi realizada pela atual professora-leitora de galego na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Lucía Sande, no mês de Maio de 2016.


É surpreendente para os galegos e galegas o maioritário desconhecimento da história da língua em países de fala portuguesa. A que se deve essa falta de interesse?

A primeira geração de filólogos portugueses, entre os quais se encontravam: dona Carolina Michaëlis de Vasconcelos, José Leite de Vasconcelos e José Joaquim Nunes, nunca deixava de lado a reminiscência linguística e histórica do galego. Acontece que a geração mais nova (talvez com exceção do professor Herculano de Carvalho), com a entrada do estruturalismo na década de 50, abandonou um pouco os estudos históricos, preocupou-se somente com a sincronia, a diacronia foi esquecida e muito raramente se apresentam fatos da língua galega. E eu escrevi um artigo dizendo que isso era ruim para quem fazia diacronia, quem fazia história da língua, uma vez que o galego estava intimamente ligado à língua portuguesa.

Eu ainda priviligiei a história porque o meu grande mestre foi o professor Said Ali. Ele trabalhava não só com sincronia senão também com diacronia. Escreveu uma gramática histórica da língua portuguesa muito original. Por tudo isso, é que você sente o desinteresse geral.

Nessa tendência que eu conheço existe uma exceção muito grande na Universidade Federal Fluminense: o grupo de galegos ligados à Maleval. Esses têm um circulo muito forte. Escreveram trabalhos importantíssimos e inclusive traduções.

Mas, você esta certíssima, há um desconhecimento total em todos os níveis, também no universitário. Talvez faça um pouco de exceção a literatura galega que é mais conhecida do que a língua. Principalmente a famosíssima escritora Rosalía de Castro. Fora isso, infelizmente, nós estamos erradamente mais divorciados de uma preocupação, de um interesse pelos estudos galegos.

Depois de tantos séculos de separação política e cultural podemos afirmar hoje que o galego e o português são ainda a mesma língua?

Quando você fala comigo eu vejo que é um português antigo, mas eu vejo que a essência portuguesa está presente em você muito mais que se você falasse espanhol, que é tão próximo também! Nossa, mas há uma distância muito grande. Os falantes de português não identificam o galego como a mesma língua, mas isso vem da mesma falta de interesse da própria sociedade.

Eu acho que é uma tarefa ingrata porque pra nós inclusive, galego, a palavra galego significa “português pobre”. O português que veio aqui trabalhar, puxar carroças, esse é que é o galego. Assim como, por exemplo, entre o árabe quando chega aqui de qualquer etnia e pobre, é um turco. Depois, ele melhora de vida e passa a árabe. E depois, se ele consegue enriquecer ele é o libanês.

Há linguistas hoje no Brasil que defendem que o português do Brasil já é uma língua diferente. Que opinião tem o senhor sobre isso?

Sim, a língua brasileira, o PB. O mundo moderno é um mundo de integração, ainda mais a integração com a lusofonia, apesar das desavenças internas que há (gente que concorda com a existência duma lusofonia, outros não), mas por formação e por convicção, eu acho que nós ainda somos uma língua só. Evidentemente com variantes naturais.

O mundo moderno caminha para uma convergência. Os blocos caminham para uma aproximação maior e justamente essa é a aproximação maior dos lusófonos.

E essas variantes deveriam introducir-se na norma culta?

Isso vai depender dum estudo que não está feito. Por enquanto, muita coisa está na fase do achismo (eu acho isso…).

Um amigo meu, o professor Raimundo Barbadinho, já falecido, escreveu um trabalho sobre a língua dos modernistas. Esse trabalho começou para mostrar justamente as diferenças, mas depois de ele levantar os modernistas e estudá-los, chegou à conclusão de que os modernistas estavam muito mais próximos dos portugueses do que de uma possível língua brasileira. E a Raquel de Queirós, que fez o prefácio desse livro, disse que depois de confrontar aqueles fatos de língua que seriam determinantes para mostrar a separação, esses fatos mostraram que brasileiros e portugueses estão muito mais próximos. Ela dizia que depois dos estudos do Barbadinho chegou à conclusão de que os modernistas eram muito mais comportados do que revolucionários da língua.

Hoje há políticos, ratazanas da política que dizem o seguinte: “se você quiser enfraquecer o inimigo, divida-o”. Agora, o mundo moderno caminha para uma convergência. Os blocos caminham para uma aproximação maior e justamente essa é a aproximação maior dos lusófonos. Vai fazer com que em vez de as línguas, por exemplo, o português da África, o do Brasil, o de Portugal, em lugar de se separarem, se aproximem.

No último congresso que houve em Portugal agora, um catedrático duma universidade do norte do país imaginou um cânone literário. Quer dizer, cada país de língua oficial portuguesa escolheria para uma antologia os seus principais representantes e essa antologia serviria de estudo de língua para todos os países de língua portuguesa.

E aí poderíamos entrar os galegos e galegas?

Aí seria a vez de entrarem os galegos. O problema dos galegos é que antes de entrar no grupo, eles têm um problema para resolver entre eles em virtude da distinção que há: uns que querem que o galego se aproxime do espanhol, outros que querem que o galego se aproxime do português e outros que querem que o galego seja independente.

Como é percebida a aproximação da Galiza à comunidade lusófona?

Eles se interessam (os acadêmicos) pela língua, pela literatura e pela cultura mas não entram porque não conhecem, não vivem o problema político. E como uma das características do brasileiro é ser acordado. O brasileiro nessas disputas geralmente não entra.

Considera oportuno ensinar aos brasileiros a normativa oficial atual do galego?

Trata-se de arranjar adeptos, agora nós não estamos na hora de falar às plateias. Como professor, está na hora de reunir a tropa.

Mas eu acho que o melhor caminho seria começar pela literatura, pelo folclore, a literatura popular ou as tradições. Porque esse substrato popular está muito mais ligado do que a língua. Então eu tenho a impressão que a língua deveria ser a última etapa de um trabalho de aproximação desse pessoal. Começar precisamente por essa parte que ficou parada, mas que ficou fora das mudanças tanto do galego quanto do português. Esse foi o grande trabalho de Leite de Vasconcelos. Ele trabalhou muito as tradições populares galego-portuguesas.

É natural que aquela pessoa jovem procure onde se pode situar melhor na vida, conseguir um bom emprego […] Com o domínio do português, essa nova geração teria mais uma porta aberta, mas esse achegamento já não é uma questão de linguística. É política.

Sobre a normalização linguística:

Isso é um trabalho gigantesco porque você conscientizar a todos os falantes de galego da necessidade de uma unificação da norma já é um problema complicado.

Isso tem que ser um trabalho de conscientizar a nova geração. O grande problema é que o mundo inteiro atravessa crises econômicas muito sérias e então é natural que aquela pessoa jovem procure onde se pode situar melhor na vida, conseguir um bom emprego. E isso dificulta a situação do galego. Com o domínio do português, essa nova geração teria mais uma porta aberta, mas esse achegamento já não é uma questão de linguística. É política.

Sobre a construção da normativa:

Considero por isso positivo um achegamento da grafia galega à do português. Mas também acho que essa norma que vocês estão construindo no espaço de 40 anos deve ser o caminho

A ideia de Renascimento de uma língua abafada por vários motivos e quer um espaço maior no universo linguístico.

Acontece que a essência da língua é a sua morfologia e nós estamos nos entendendo porque a morfologia é a mesma. É a que nos aproxima. O problema está no léxico. Você veja bem, se você fosse classificar o romeno pelo léxico, o romeno não seria uma língua românica. Só tem dez por cento de elementos latinos no seu léxico. Agora, se você pegar aqueles sectores lexicais que realmente estão voltados para a essência do povo, você vai ver que aí é que estão as raízes latinas do romeno. Se você fosse classificar o inglês pelo léxico, ele seria uma língua românica, porque tem tanto de latim e grego… Todos os setores, que atuam e que cercam a sociedade, influem no vocabulário. É como, por exemplo, a ortografia. O romano só foi descoberto como língua românica no século XVI porque era escrito em cirílico. Considero por isso positivo um achegamento da grafia galega à do português.

Mas também acho que essa norma que vocês estão construindo no espaço de 40 anos deve ser o caminho. Vocês fariam o mesmo que a Holanda “Deus fez o mundo, mas o holandês fez a Holanda” esse é o trabalho de vocês. Vocês devem olhar como os novos holandeses a língua. A filosofia é essa. É você ir conquistando. Eu acho que vocês devem procurar o seu caminho, como irmãos do português e não como filhos, de igual para igual. E uma situação assim como uma família, uma pessoa se desgarra e depois de muitos anos eles se encontram. E realmente eles são irmãos, mas eles são diferentes, a visão do mundo é diferente e é nesse sentido que o galego tem que constar a sua individualidade.

8 comentários em “E. Bechara: “Com o domínio do português as novas gerações galegas teriam mais uma porta aberta para conseguir um bom emprego””

    1. Geolingua: novo nome para o Galego-brasileiro.

      Abaixo, transcrevo a sinopse de uma Obra, futura, em suporte Livro, Teatro e Cinema 3D.

      Como nasceu a língua “portuguesa”

      .. pelos Reis, D. Afonso X de Leão e Castela, D. Dinis sexto rei de Portugal, Alexandre Herculano, historiador de referência e – Humberto Eco, conceituado filósofo … e, tudo relatado por Roberto Moreno, prof. e historiador, fundador da Fundação Geolíngua – cujo objetivo é: transcender a língua “portuguesa”.

      Colocações factuais e históricas.

      1 – D. Dinis, sexto rei de Portugal, em 1296, por decreto, instituí o português na Chancelaria Real, na redação das leis, nos notários e na poesia, eliminando a palavra Galego, por razões socioculturais e geopolíticas. – Adotou uma língua própria para o reino, tal como o seu avô, espanhol, D. Afonso X, fizera com o castelhano a partir de 1252, também eliminando a palavra Galego, pelas mesmas razões, geopolíticas (embora, ambos continuassem a utilizar o Galego em suas poesias). – Portanto, como reza a história e, diante dos fatos (factos) – A dita língua “portuguesa” foi criada por Decreto, e, o Galego foi sumariamente banido, ocultado e torturado durante 8 séculos, para já não falar há mais de 2 mil anos, quando se mesclou com o Latim, dando origem ao Galego-latinizado (conhecido como latim vulgar) e que se fala hoje, principalmente em Portugal e no Brasil, nos seus dois dialetos, o português e o brasileiro, respectivamente.

      2 – O conceituado historiador Alexandre Herculano em 1874, disse: “A Galiza deu-nos população e língua, e o português não é senão o dialeto galego civilizado e aperfeiçoado”

      3 – «O certo é que as línguas não podem ter nascido por convenção já que, para se porem de acordo sobre as suas regras os homens necessitariam de uma língua anterior; mas se esta última existisse, por que razão se dariam os homens ao trabalho de construir outras, empreendimento esforçado e sem justificação? » – (Umberto Eco)

      __________________________________________

      Proposta de Roberto Moreno, fundador da Fundação Geolíngua:

      À luz dos fatos e da história e diante destas três colocações – a Fundação Geolíngua propõe-se a seguir os mesmos passos dos Reis D. Dinis e D. Afonso X, no âmbito de ambos, terem criado as duas primeiras “marcas brancas” do mundo, ao nomear de “português e castelhano”, o – Galego.

      O objetivo é designar o Galego, no seu dialeto brasileiro (em sintonia com Alexandre Herculano) – por GEOLÍNGUA (língua da terra). – É uma espécie de “Esperanto II” – uma “nova marca branca” – 8 Séculos após à marca “português”, ter sido criada.

      Esta proposta resulta de uma minuciosa e fundamentada investigação científica, ao consultar varias fontes, além das “oficiais”, desde 1992, onde se vislumbra que: a percentagem que separa uma língua de outra – é de aproximadamente 20%. A diferença, hoje, entre o português de Portugal e o galego é de 7% e, entre o português e o “brasileiro” é de 3%. – Portanto, histórica e cientificamente analisada, o português simplesmente não existe como língua, mas sim como – dialeto evoluído e aperfeiçoado – como afirmou Alexandre Herculano.

      Nesta perspectiva – a futura Geolíngua (Galego-brasileiro) passa a ser a primeira língua do mundo, pelo fato desta, entender 90% do “espanhol”, 50% do italiano e 30% do francês, sem qualquer dificuldade (pelo menos, na linguagem escrita) e une, para já e, a partir do Galego-castelhano (espanhol) 800 milhões de pessoas em 30 países e nos 5 continentes e – se acrescentar o italiano ultrapassa os 900 milhões, superando o inglês e o mandarim, com a vantagem de – a Geolíngua possuir, além do aspecto quantitativo, também o qualitativo, geopolítico e geoeconômico, em simultâneo, o que não é encontrado em nenhuma outra língua do planeta.

      Algumas fontes consultadas:

      Este vídeo ilustra algo mais sobre o projeto Geolíngua: – http://www.youtube.com/watch?v=aisI7SEry4c

      – Língua brasileira – http://cafehistoria.ning.com/profiles/blogs/a-lei-fora-da-lei

      – O Brasil fala a Língua Galega – http://www.udc.gal/dep/lx/cac/sopirrait/sr044.htm – artigo do Prof. Catedrático Júlio César Barreto Rocha, da Universidade de Santiago de Compostela.

      – O português vem do Galego – “Não é correto, do ponto de vista histórico-geográfico, afirmar, como fazem todas as gramáticas históricas, que “o português vem do latim”. – O português vem do galego – o galego, sim, é que representa a variedade de latim vulgar que se constituiu na Gallaecia romana e na Galiza medieval” – Marcos Bagno

      “O nosso idioma é muito mais antigo que a nação. Isto significa que, se nunca Portugal tivesse surgido, esta mesma língua (hoje chamada portuguesa) teria existido sem ele”. Palavras do Prof. Fernando Venâncio, da Universidade de Amsterdam, referindo-se à língua Galega. – E, acrescenta: «Se a língua de Afonso Henriques algum nome pudesse ter tido, era só este: galego».

      “Entre Latim e Português: o Galego”
      https://www.facebook.com/notes/fernando-venâncio/entre-latim-e-português-o-galego/872947272754366/

      Quanto ao Acordo Ortográfico, sugiro ver a posição de Roberto Moreno, aqui
      http://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheAudicao.aspx?BID=94935

      Iberofonía – uma visão de Graça Castanho, candidata à presidência da República de Portugal – http://lusopresse.com/2011/254/GeoLingua.aspx

      Português, lengua de la globalización! – É assim, com este título, que começa uma crónica escrita por Roberto Moreno, em 2005, a pedido da jornalista Oriana Alves, na época, a serviço do Instituto Camões, em Lisboa, para uma matéria no Jornal de Letras, de Portugal. – Entretanto, por ORDEM do referido Instituto, esta crónica nunca chegou a ser publicada e foi arquivada sumariamente! – Cá está a Crónica que foi censurada – http://www.recantodasletras.com.br/artigos/3814553

    2. Caro Luiz Carlos Ribeiro, não há nada mais ofensivo para um Cidadão Galego, esclarecido, do que propor-lhe à aprender o “português”. – O motivo, histórica e cientificamente comprovado, é que a autoproclamada língua “portuguesa” é, na realidade – um dialeto do galego (segundo Alexandre Herculano em declaração de 1874) alem de outros inúmeros historiadores, linguistas e filólogos, a sério. – A dita língua “portuguesa” foi criada por decreto em 1296 pelo então rei de Portugal, D. Dinis, por factores geopolítico e para demarcar o território de Portugal, do reino de seu avó, D. Afonso X, rei de Leão, Castela e Galiza. – Para maiores detalhes, sugiro ler o meu comentário, logo mais abaixo.

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